16 de nov. de 2009

Tudo pelo social (e pelo dinheiro também)

Sete jovens empreendedores tocam os chamados negócios sociais, economicamente viáveis e que pretendem reduzir a pobreza

Por Carin Hommonay Petti

Eles não abriram negócios tradicionais. Nem criaram ONGs. Os sete jovens empreendedores abaixo escolheram o caminho do meio. Tocam os chamados negócios sociais, iniciativas economicamente viáveis que têm como meta reduzir a pobreza com seus produtos, serviços ou a inclusão dos menos favorecidos na cadeia produtiva. Conheça o negócio de cada um deles

O sócio capitalista Antonio Moraes, 23 anos, idealizador do fundo de capital de risco Vox Capital

Se empresas convencionais já enfrentam dificuldades em captar recursos de sócios capitalistas, a situação é ainda mais espinhosa nos negócios sociais, geralmente pouco apetitosos aos olhos dos investidores. Disposto a solucionar o problema, Antonio Moraes, neto do megaempresário Antonio Ermírio, rejeitou a proposta de emprego numa consultoria. Preferiu se dedicar à criação do Vox Capital, o fundo de capital de risco que havia concebido em seu trabalho de conclusão do curso de administração pública da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Alimentada com recursos de investidores americanos, a Vox injeta de R$ 150 mil a R$ 1 milhão em empresas com até dois anos de estrada, que, além de rentáveis e com potencial de escala, ajudem a reduzir a pobreza ou melhorar a qualidade de vida da população de baixa renda – seja com seus serviços, produtos ou inclusão social na cadeia produtiva.

A Vox tem ainda outra peculiaridade: diferentemente dos fundos de venture capital convencionais, que compram participação em empresas com a intenção de vender suas ações mais tarde, ali a saída dos sócios capitalistas não é necessariamente parte do jogo. Nada os impede de continuar no negócio por tempo indeterminado.

Aos sem-banco Alessandra França, 23 anos, fundadora do Banco Pérola

O pai de Alessandra França é caminhoneiro. A mãe, costureira. “Se tivessem conseguido crédito, poderiam ter ido mais longe na vida.” É justamente isso que ela busca para os beneficiados pelo Banco Pérola, a instituição de microcrédito que concebeu. A ideia nasceu quando trabalhava como coordenadora do Projeto Pérola, uma Oscip que promove cursos de computação e cidadania para jovens de baixa renda do interior de São Paulo. “Muita gente tinha planos de abrir um negócio, mas faltava dinheiro para tirar o projeto do papel”, diz. Justamente para tirar as ideias do papel, ela procurou a Artemísia, ONG que apoia negócios sociais. Depois de aprovada num processo de seleção com 200 candidatos, conseguiu da entidade R$ 40.000 para fundar o banco.

Agora começa a primeira rodada de empréstimos, de até R$ 1 mil, a 20 jovens empreendedores de baixa renda de Sorocaba, no interior paulista. Entre os beneficiados, vendedores de cachorro quente, de bijuteria e até de produtos eróticos – gente que, por operar na informalidade, mal atravessa a porta dos bancos. Os juros mensais são de 4% ao mês e o prazo de pagamento de até sete meses, período em que os beneficiados recebem orientação financeira para pôr o negócio nos trilhos. Para viabilizar novos financiamentos agora Alessandra busca parcerias com bancos.

O mercado pelo avesso Omar Haddad, 25 anos, fundador da Sementes de Paz, cooperativa de produtos orgânicos

Omar e quatro outros estudantes de ciências sociais da Universidade de São Paulo criaram a cooperativa Sementes de Paz com o intuito de inverter a lógica convencional do comércio e do consumo. Em vez de produzir primeiro para vender depois, a cooperativa faz o contrário. Só vai para o campo depois de criar a demanda – encomendas de frutas, verduras e legumes orgânicos realizadas por 150 famílias paulistanas. As encomendas são feitas pela internet e a produção fica a cargo de pequenos agricultores credenciados. “Com o sistema, eles podem planejar o plantio, evitar perdas e ainda aumentar o preço de venda em até 100%”, afirma Omar. Ainda assim, os produtos chegam à mesa por preços até 30% menores que os encontrados nos supermercados. Cada cesta custa de R$ 25 a R$ 50 conforme a variedade e quantidade de produtos.

Design solidário Tiago Dalvi, 23 anos, fundador da Solidarium, empresa de comércio justo de artigos de decoração, moda e utilidades domésticas, entre outros produtos

Desde os tempos da faculdade de administração, Tiago planejava abrir o próprio negócio. Mas não qualquer negócio. “Não me via, por exemplo, vendendo geladeiras.Queria algo com impacto social.” Desse objetivo, nasceu, em 2007, a Solidarium. Neste ano, a empresa curitibana deve faturar cerca de R$ 500 mil com a venda de artigos de decoração, moda e utilidade doméstica para gigantes como Wal-Mart, Tok&Stok e Renner. A confecção dos itens – de tapetes a portas-caneta – criados por escritórios de design fica a cargo de 270 produtores de baixa renda, a maior parte mulheres, organizadas em associações, cooperativas ou grupos de trabalho. Pelos produtos, elas recebem até 3,5 vezes o que ganhariam sozinhas. As mulheres têm também a liberdade de trabalhar em casa nos melhores horários para elas – arranjo que permite gente antes sem atividade remunerada a ajudar a complementar a renda da família. Ainda assim, o negócio é lucrativo, graças à estrutura enxuta e ausência de outros intermediários na cadeia produtiva. “Só com lucro podemos gerar renda”, diz Dalvi.

Da Amazônia à Suíça Henrique Bussacos, 29 anos, fundador da Tekoha, especializada na venda de artesanato produzido por comunidades vulneráveis

Henrique começou a carreira no mercado financeiro. Trabalhava na área de fusões e aquisições do JP Morgan. “Eu gostava tecnicamente do trabalho, mas não via sentido naquilo.” A guinada profissional veio com uma viagem à Amazônia. “Percebi que, sem condições para comercializar os produtos, muita gente deixava as comunidades ribeirinhas para viver na pobreza nas cidades.” Em 2007, ele abriu a Tekoha, uma loja virtual de artesanato produzido por 26 grupos espalhados pelo Brasil, de índios do Pará a famílias do sertão baiano. O faturamento previsto para este ano é de cerca de R$ 110 mil. Do total, 40% vêm da venda de brindes corporativos. Para 2010, a previsão é aumentar a receita em torno de 35%, com o aumento das exportações para países como Polônia e Suíça. Em cada venda, cerca de 50% da receita fica com os produtores, 25% cobre custos e despesas e o restante corresponde ao lucro do negócio. Quer saber qual é a divisão exata na comercialização de um item específico? A empresa fornece por e-mail a informação aos interessados. Não só na divulgação de informações a Tekoha inovou. Para viabilizar a abertura do negócio, Henrique recorreu a uma fórmula inusitada: vendeu a sócios capitalistas seis cotas da empresa por dez mil reais cada uma. Em troca, eles terão direito a participação nos lucros da empresa por um período de quatro anos. Apesar disso, eles não podem interferir na gestão do negócio. Além dos R$ 60 mil obtidos com a estratégia, para fundar o negócio, o empreendedor conseguiu outros R$ 40.000 da Artemísia.

Uma boa impressão Luiz Flavio Lima, 26 anos, criador da revista Menisqüencia

Não faltam por aí ONGs dispostas a organizar cursos para adolescentes. Também pipocam revistas inspiradas na pioneira britânica The Big Issue, feita por jornalistas e vendida por moradores de rua. O ex-locutor de bingo e professor de histórias em quadrinhos Luiz Flavio uniu os dois conceitos com a criação da Menisqüencia, concebida com o apoio do cartunista Laerte e produzida e comercializada por adolescentes de baixa renda de região da Brasilândia, periferia da zona norte paulistana. Para viabilizar a empreitada, o grupo de 60 jovens tem aulas de ilustração, design gráfico, jornalismo, fotografia e empreendedorismo, entre outras. Depois saem às ruas para vender os exemplares, a R$ 3 cada um, em bares, restaurantes e shoppings, entre outros locais. Detalhe importante: com o reforço dos anúncios publicitários, a revista começa a sobreviver com as próprias pernas.

O professor de hip-hop Marcelo Silva Rocha, o DJ Bola, 28 anos, fundador da produtora cultural A Banca

O ex-motoboy Marcelo, fundador da produtora cultural A Banca, falou à Pequenas Empresas & Grandes Negócios quase à meia-noite de uma quinta-feira. Acabara de dar aulas a aspirantes a DJ “na quebrada da Vila Calu”, na região do Jardim Ângela, o bairro paulistano que por anos foi conhecido como uma das regiões mais violentas do mundo. Além do curso, A Banca também organiza aulas gratuitas de violão e MC (rimas de hip hop), em parte financiadas pela prefeitura.
Mas não só a música domina os encontros organizados por Marcelo, conhecido mesmo como DJ Bola. “Trocamos ideias para ajudar a resolver problemas, de drogas a brigas em família”, conta ele. “Os meninos até me chamam de pai.” O lucro do negócio vem da organização de eventos, como produção de festas e aluguel de equipamentos de som.

Fonte: http://revistapegn.globo.com/Revista/Common/0,,EMI103755-17171-2,00-TUDO+PELO+SOCIAL+E+PELO+DINHEIRO+TAMBEM.html

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